Caminho por um mar de neve, numa jaula de frio gelo… Encerrei-me numa masmorra profunda e gelada. Escondi todas as emoções num pequeno baú negro, e enterrei-o nas trevas dos meus pensamentos, onde jamais fosse recuperado. Corri as cortinas da minha vida. Abandonei o sol e a luz. Entreguei-me à profundidade do meu destino. Cansei-me de rumar contra a maré, contra o mundo, contra mim mesmo… Abstenho-me de sentir, de ver, de ser… Prefiro ficar suspenso no limiar da existência, dotar-me ao abandono…
Tenho espírito felino, alma de pantera gigante. Afasto tudo e todos num rosnar inaudível.
Guardo o meu terreno onde ninguém o possa encontrar, onde eu não o possa largar. Percorro felinamente as fronteiras da minha racionalidade. Não quero ninguém cá dentro, não quero ninguém comigo. Quero estar só. Quero ficar entregue à minha solidão, à solidão que eu escolhi.
Sou um filho da noite… Quero uma geada nocturna que me corte a respiração. Quero uma lua suficientemente grande para esmagar a minha consciência. Quero deixar de me conseguir envolver nos meus braços, quero ser capaz de deixar de me sentir. Ficar só e apenas entregue ao frio, à escuridão, ao bloco de gelo que troquei pelo coração.
Construo arduamente invisíveis muros do mais cristalino gelo celeste. Só fica espaço para mim e para as asas que me envolvem. Ninguém mais pode passar, ninguém pode cruzar este muro, ninguém pode cruzar o meu caminho…
Sinto-me dormente no meu corpo. Paro no meio de todos os que me rodeiam só para observar a nuvem de ar que expiro, que condensa e sobe nos céus. Sou tão pouco do mundo. Não sou mais que uma gota de uma tempestade… Mas sou sim. Sou o trovão invisível. Sou o som da luz, da escuridão. A minha alma ressoa com o trovão da tempestade.
Quero gritar. Quero expelir à velocidade do som todo o desejo de voar que me assola. Quero gritar até partir todo o gelo que se formou em mim. Quero gritar até não mais ter forças para o fazer. Quero gritar até me esvair em ar e sons profanos. Quero gritar até ficar inconsciente e fora de mim…
Um olhar certo faz ferver o sangue nas veias. Queria ser um bocado de vento. Perder-me no ar da mesma forma que o faço na terra. Quebrei a minha bússola há demasiado tempo atrás. Não tenho esperança nas ferramentas humanas, só nas estrelas.
Ser fiel a mim mesmo, esquecer quem sou. Quem penso que sou… Sou um cubo quebrado, um puzzle com peças a mais. Sou um enigma intricado e insolúvel. Nunca me vou resolver. Nunca ninguém me vai resolver…
http://translucencias.blogs.sapo.pt/
GElo
Wednesday, July 05, 2006
Posted by Brottas at 7:56 AM
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